Os efeitos devastadores do aquecimento global estão a ser sentidos por biliões de pessoas. Mas, entretanto, os grandes tubarões capitalistas estão abertamente a desvalorizar os riscos. Tal como Nero antes, os governantes festejam hoje enquanto Roma arde.
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Enquanto incontáveis centenas de milhões de pessoas estão em risco pela subida dos níveis do mar, num futuro próximo, outros tantos milhões experimentam já os efeitos da seca. Devido ao aumento das temperaturas e calor extremo, as Nações Unidas estimam que mais de 2,3 biliões de seres humanos estão já a enfrentar “stress de água”.
Entre estas encontram-se 160 milhões de crianças expostas a secas severas e prolongadas. O capitalismo, com a exploração irresponsável do planeta em nome do lucro, está a negar a biliões de seres humanos as mais básicas necessidades e a transformar imensas extensões de terra em cruéis desertos.
A África subsaariana tem tido particularmente afetada pela escassez de água. Em Maio, foi já reconhecido que o chamado “Corno de África” , entrou na sua pior seca em quatro décadas e que até 20 milhões de pessoas poderiam padecer de fome, como resultado. 40% da população da Somália já se encontra em “insegurança alimentar”.
Mas esta crise não se encontra limitada ao continente africano. Em meados de Junho a Europa experimentou uma inusual e precoce vaga de calor extremo, com temperaturas record a serem batidas no centro do continente. Incêndios devastadores têm-se espalhado não apenas na orla do mediterrâneo, mas também na Alemanha, com muitos milhares de evacuados para escapar às chamas.
A utilização de combustíveis fósseis é a principal força motriz por detrás do aquecimento global. Relatórios do Painel Intergovernamental para a Alteração Climática dizem que para limitar o aquecimento global a 1,5 graus acima dos níveis pré-industriais (os limites estabelecidos pelos Acordos Climáticos de Paris…), a emissão de gases de efeitos de estufa teria de ser reduzida em 43% até 2030 e atingir as zero emissões em 2050.
Para atingirmos as emissões zero, a Agência Internacional de Energia concluiu num relatório do ano passado que não poderá haver novos poços de petróleo perfurados, campos de gás abertos ou minas de carvão escavadas.
Para ir ao encontro destas metas, seria necessário uma radical e rápida transição dos combustíveis fósseis para fontes de energia alternativas. Sob o capitalismo orientado para o lucro, não apenas estamos a falhar em alcançar essas metas, como estamos a ir na direção contrária.
Embora muitas companhias tenham definido objetivos e metas para a redução das emissões de gases de estufa, não existem, na verdade, verdadeiros planos para que sejam colocados em prática. Um estudo da New Climate indica que as principais 25 grandes corporações (incluindo Google e Amazon) estão não apenas a falhar nas suas próprias metas, mas rotineiramente exageram os seus insuficientes progressos.
Isto apenas mostra que as chamadas “regulações climáticas” permanecerão uma letra morta enquanto os meios de produção estiverem controlados por uma minoria parasitária.
As verdadeiras preocupações da classe dominante
A verdade é que, enquanto um sector da classe dominante está alarmado com as perspetivas das alterações climáticas, o sistema capitalista no seu conjunto é motivado primeiro e principalmente pela insaciável gula por lucros a curto-prazo. E alguns dos mais degenerados e míopes capitalistas assumiram uma atitude totalmente arrogante, quando não abertamente negacionista sobre as alterações climáticas.
Por exemplo, ainda no princípio deste ano o Financial Times organizou uma conferência intitulada “Porque é que os investidores não precisam de se preocupar com o risco cilmático?”
Entre outras pérolas, o conferencista Stuart Kirk explicava que “em 25 anos na indústria financeira, tenho apanhado sempre um ou outro maluco anunciando o fim do mundo” (…). Continuo a queixar-se que “temos agora inúmeros reguladores, a competição da China, inflação, aumento das taxas de juro, os problemas do mercado imobiliário, mas dizem-me que tenho de me focar em algo que irá acontecer daqui a 20 ou 30 anos. (…) Concluindo que “Os seres humanos são fantásticos na adaptação à mudança. E assim continuaremos a ser. Que interessa se Miami daqui a 100 anos estará 6 metros abaixo do nível do mar? Amesterdão está há séculos 6 metros abaixo do nível do mar e é um sítio verdadeiramente simpático.”
Por outras palavras: que interessam algumas cidades submersas em comparação com um bom portfólio de investimentos? Esta é a sobranceria dos grandes bancos e corporações que colocam as suas taxas de lucro, balancetes e livros de contas acima da sobrevivência da humanidade no futuro.
“Bombas de Carvão”
Os capitalistas estão naturalmente relutantes em abdicar dos superlucros proporcionados pela indústria dos combustíveis fósseis. Nas últimas três décadas a Exxon-Mobile, Shell, BP e Chevron realizaram quase 2 triliões de lucros. Um dos diretores da BP costuma descrever a companhia como uma máquina de fazer dinheiro. Por conseguinte, persistentemente ignoram as devastadoras implicações de escalarem a produção de energia fóssil.
Ora uma investigação do The Guardian mostra que os planos para novos projetos de gás e petróleo nos próximos sete anos, produzira a quantidade de gases de efeito de estufa equivalente às emissões de CO2 pela China na última década.
Incluídos nesses planos estão 195 chamadas “bombas de carvão”, que são projetos de gás e petróleo os quais, cada um deles, produzirá pelo menos um bilião de toneladas de CO2 emitidas ao longo do tempo de vida desses projetos, o que terá (obviamente) um enorme impacto destrutivo sobre o ambiente.
Os Estados Unidos, Canadá e Austrália têm os maiores planos de expansão para estas “bombas de carvão” e também são os países que mais subsidiam, per capita, as energias fósseis. As 12 maiores companhias petrolíferas estão preparadas para gastar 103 milhões diários durante o resto desta década de modo a explorar novos campos de petróleo e gás. Estes planos tornarão impossível a travagem do aquecimento global.
Assim, enquanto caminhamos para uma catástrofe climática os líderes mundiais, como avestruzes, enterram a cabeça na areia. Apesar do facto das indústrias de gás e petróleo serem responsáveis por 60% das emissões de CO2, não há qualquer menção ao sector do gás ou petróleo no acordo final da Conferência das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas – COP26. Muitos dos países mais desenvolvidos que cinicamente se descrevem como “líderes climáticos”, são também os maiores impulsionadores das “bombas de carvão”.
Em 2020, quando Joe Biden era candidato à presidência dos Estados Unidos, apelava à transição do petróleo e gás, rompendo com a dependência americana dos combustíveis fósseis. Hoje, com as suas 22 “bombas de carvão”, os Estados Unidos têm o potencial para emitir 140 biliões de CO2, 4 vezes mais do que o total de emissão anual do resto do mundo. “Bombas de carvão”? “Bombas «Nucleares» de carvão”!
E os grandes países imperialistas estão agora usar a guerra na Ucrânia como pretexto para justificar os seus planos de expansão das indústrias do gás e petróleo.
Em Março, Biden anunciou um acordo com a Europa que garantirá um acordo de longo prazo pelos combustíveis fósseis dos Estados Unidos até, pelo menos, 2030. Nos primeiros quatro meses de 2022, os Estados Unidos expediram quase 75% do total do seu gás liquefeito para a Europa. A Secretária de Estado da Energia do executivo Biden afirmou no mês passado, perante uma plateia de executivos das indústrias fósseis, que os Estados Unidos encontram-se agora em “prontidão de guerra”, explicando que “neste momento de crise precisamos de mais abastecimentos de petróleo, o que significa que terão de produzir mais desde já, onde e se for possível”.
Por outras palavras, assim que os interesses do imperialismo americano foram ameaçados com a guerra na Ucrânia, toda a conversa sobre Biden ser o “presidente climático” evaporou-se como vapor de água.
Superlucros
Muitos patrões da indústria do petróleo e gás estão a chorar por causa da guerra na Ucrânia: choram lágrimas de alegria! A guerra exacerbou a já alta de preços do gás e petróleo, o que significa a expansão dos lucros para si e para os seus acionistas.
Entre janeiro e Março, a Shell realizou 9,1 biliões de lucros, o que é quase três vezes mais do que no mesmo período em 2021. Exxon também alcançou uma escalada de lucros com 8,8 biliões. A BP chegou aos 6,2 biliões, conseguindo os maiores lucros quadrimestrais da última década.
Como afirmou o Chefe financeiro da BP, Murray Auchincloss: “é possível que estejamos a ganhar mais dinheiro do que aquele que consigamos gastar”. Por outro lado, 40% dos lares britânicos arriscam-se a chegar à “pobreza energética” já em Outubro. Estes parasitas empanturram-se com a morte, destruição e pobreza criadas por uma guerra imperialista, enquanto ignoram as mais perigosas implicações e ameaças para as futuras gerações.
Como sempre, é a classe trabalhadora que tem de pagar a crise do capitalismo. Tanto no que diz respeito a ter de viver com as catastróficas consequências das alterações climáticas, como com os choques económicos que estão a empurrar milhões para a pobreza. E, entretanto, os capitalistas embolsam os seus biliões, sem preocupações com as consequências futuras.
O capitalismo é incapaz de salvar o planeta. Pelo contrário, é a maior ameaça à civilização humana e irá sempre priorizar os lucros sobre a saúde do planeta e a vida das pessoas. Ao invés de deixarmos a luta climática nas mãos dos capitalistas e dos políticos, a classe trabalhadora e as suas organizações têm de lutar pelo controlo da economia, colocando-a nas suas próprias mãos através da expropriação destes parasitas.
Apenas pelo controlo das indústrias poluidoras e dos grandes bancos, poderemos transformar a sociedade de acordo com um plano geral que beneficie o planeta e as necessidades humanas. Este é o único caminho capaz de esquivar a queda na barbárie para a qual o capitalismo nos condena.