A pandemia, o risco de desabastecimento e o Fora Bolsonaro

A crise provocada pelo coronavírus já começou a causar gargalos no transporte de carga no Brasil, o que demonstra as fragilidades de nosso sistema, devido ao monopólio do setor rodoviário no transporte de cargas gerais.


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Com o agravamento da pandemia da Covid-19, podem ser adotadas medidas mais restritivas que venham a impedir a entrega de cargas de todos os produtos que são consumidos internamente no país, principalmente alimentos.

A situação e a iminência de uma crise de abastecimento levou o Ministério da Infraestrutura a se reunir na noite da última sexta (27/3), com representantes de todos os estados para discutir a situação e garantir de livre circulação de mercadorias. Entre as medidas adotadas pelo governo federal e as concessionárias de rodovias, está a suspensão da pesagem dos caminhões por 90 dias. A isenção da cobrança de pedágio por 90 dias foi descartada. A queda na movimentação de cargas para abastecimento do mercado interno é certa, segundo as análises das empresas do setor.

As rodovias sobrecarregadas e precárias também não contam com redes de apoio para os caminhoneiros, que mesmo ainda não sofrendo restrições de circulação, estão encontrando imensas dificuldades para continuarem a trabalhar, pois sequer conseguem garantir locais para alimentação.

O que podemos observar é uma concentração excessiva do modal rodoviário na movimentação das cargas, o que provoca impacto inclusive na matriz energética, agregando custos tanto na cadeia produtiva, quanto na cadeia distributiva. Essa concentração ampliou-se depois de 1996, com o processo de privatização/concessão da malha ferroviária do país. A Rede Ferroviária Federal (RFFSA), por exemplo, foi incluída no Programa Nacional de Desestatização (PND) através do Decreto nº 473/93, de 10 de março de 1993.

Nestes 24 anos de operação privada a participação do modal ferroviário na matriz de transportes caiu de 20 para 18%. Se retirarmos o transporte de minério, a participação do modal gira em torno de 7%. Isso quer dizer que na movimentação de cargas gerais no mercado interno, representado pelo transporte de produtos e insumos industrializados, a participação das ferrovias é de 7% (ainda assim, para atender corredores de exportação), contra 91% da modalidade rodoviária.

As ferrovias privatizadas, mesmo contando com todas as facilidades patrocinadas por todos os governos desde Fernando Henrique Cardoso, passando por Lula, Dilma, Temer e Bolsonaro, não cumpriram e nem cumprem as metas estabelecidas nos contratos de concessão e arrendamento, não realizaram os investimentos necessários, não reduziram o número de acidentes, não aumentaram a capacidade de transporte, não conseguiram alterar o foco dos negócios que tem como prioridade atender corredores de exportações, transportando cargas a longas distâncias e de baixo valor agregado.

A ferrovia, para recuperar sua capacidade inclusive de escoamento, deve alterar o foco do negócio para poder recuperar as cargas tipicamente ferroviárias que ao longo dos anos migraram para o modal rodoviário, como os granéis agrícolas (soja, feijão, arroz etc.), derivados de petróleo, produtos siderúrgicos, produtos industrializados, desenvolver o uso de contêineres e até mesmo minérios de maior valor agregado.

Essa discussão é muito importante neste momento em que se aprofunda a crise sanitária, econômica e política no país. Além dos impactos econômicos gerados pela situação, o governo Bolsonaro, ao defender os interesses do capital e das grandes corporações—que apoiam suas declarações e manifestações que minimizam os efeitos danosos do coronavírus—, incita a população a não seguir as recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS) e cria uma crise política no próprio governo, que tem como resultado a piora das condições de vida da classe trabalhadora.

Esta pandemia que pode levar a uma crise de abastecimento em razão das fragilidades do sistema de transportes no Brasil, nos mostra também que não se pode depender única e exclusivamente de modo de transporte para se promover a circulação interna de mercadorias. É necessário romper com este modelo monopolizado, que só interessa às grandes transportadoras existentes no país.

Em seu pronunciamento de 31 de março, Bolsonaro incitou os caminhoneiros a paralisarem suas atividades em razão das medidas de quarentena. Como este setor monopoliza o transportes de cargas gerais, grandes transportadoras e motoristas autônomos que possuem pequenas frotas, se utilizam da ameaça de lockout.

Para romper com este modelo é necessário lutarmos pela implantação de uma Rede Ferroviária Nacional de caráter público e estatal, cuja finalidade será de planejar, regular, operar e manter o sistema nacional ferroviário, que atue no setor de cargas, passageiros e passageiros urbanos, que deve estar integrado a um novo Plano Nacional de Viação, Transportes e Mobilidade, que priorize como matriz o modal ferroviário.

Para dar consequência a essa nova política de uma Rede Ferroviária Nacional, que deverá traduzir o novo Plano Nacional de Transportes e Mobilidade, consideramos como condição imperativa a reestatização das ferrovias, colocando-as sob administração especial do Estado, que deverá assumir suas responsabilidades de controle, planejamento, financiamento, gestão e operação, além de proceder a uma rigorosa auditoria no sistema para que a União seja ressarcida dos prejuízos provocados pelos operadores privados.

Para que essa mudança estrutural ocorra, é necessário que tenhamos um governo comprometido com os interesses da classe trabalhadora e da juventude, que rompa com o ciclo de dominação do capital que esmaga e destrói como vem fazendo Bolsonaro e toda a trupe que o apoia.

O que deverá levar milhares às ruas após o isolamento social, deverá ser a luta pelo Fora Bolsonaro, por um governo dos trabalhadores sem patrões nem generais. Neste momento, devemos nos utilizar de todos os meios disponíveis para explicar por que temos que construir os Comitês Populares Pelo Fora Bolsonaro e agrupar o maior número de trabalhadores e jovens nesta luta.

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