O lugar dos EUA na cena mundial como principal potência imperialista e a declaração de Obama de que “A mudança chegou”, são a prova de que as forças produtivas da humanidade se debatem nos limites dos estados nacionais e do regime da propriedade privada dos grandes meios de produção.
De fato, o que as forças mais profundas da civilização humana exigem é liberdade para se desenvolver em escala planetária, orientadas pela busca da satisfação das necessidades humanas e seu desenvolvimento. E não mais pela busca do lucro arrancado do suor e do sangue dos homens escravizados pelo regime capitalista. A tentativa fracassada de realizar isso no regime capitalista é o que se chamou de “globalização”.
Mas se as comemorações expressam o desejo de milhões de enterrar o sofrimento que o capitalismo “realmente existente” provoca, não há como deixar de constatar que as esperanças em Barack são apenas ilusões. Obama aparece como o negro, com jeito de pobre, que desafiou os poderosos e que vai “mudar a vida”. Ele busca representar em seu mais alto grau a propaganda do capitalismo norte-americano que diz que qualquer um pode ser rico, feliz e poderoso, bastando para isso trabalhar duro e ter “oportunidades”. É a miséria do “Sonho Americano”.
São estas ilusões que Obama tentar aprofundar quando repete, na noite da vitória, o que disse durante toda a campanha: “Demorou muito tempo, mas, nesta noite, a mudança chegou à América”... “Se ainda há alguém que duvida que os Estados Unidos sejam o lugar onde todas as coisas são possíveis, que ainda duvida que o sonho de nossos fundadores esteja vivo em nosso tempo, que ainda questiona o poder da nossa democracia, aqui está a resposta”.
O que sim há de positivo na vitória de Obama é que o povo norte-americano demonstrou outra vez que é um povo extraordinário e que racistas são os capitalistas e seus seguidores podres. As extraordinárias lutas de classes que o proletariado norte-americano já desenvolveu no passado assim como as suas greves e manifestações heróicas fazem parte da história da classe trabalhadora mundial, e o voto em Obama expressa deformadamente (porque através de um candidato imperialista de um partido imperialista) a força desta vontade popular de se livrar dos horrores das guerras, da repressão, do trabalho precário, da falta de Saúde e Educação públicas e gratuitas.
A tragédia é que a luta do povo se expresse como fraude e como armadilha através da vitória do candidato do Partido Democrata por responsabilidade exclusiva dos dirigentes do movimento operário norte-americano, em especial da AFL-CIO, que se passaram para o capital e sustentam o aparato Democrata recusando construir um verdadeiro Partido dos Trabalhadores, um Labor Party que abra uma perspectiva socialista para todos os oprimidos. Enquanto isso não for resolvido, as ilusões continuarão surgindo, se reforçando e sendo depois despedaçadas a golpes de facão desferidos pela dura e crua realidade do dia a dia das classes trabalhadoras governadas pelo capital.
Mas, por trás das ilusões se esconde uma cruel realidade sobre o presidente negro apoiado por Wall Street e por Warren Buffet, o homem mais rico do mundo.
“Deus salve a América” (e principalmente o sistema financeiro)
No dia 5 de outubro, no auge da queda no mercado de ações, uma cena insólita acontecia na Bolsa de Valores de Paris. Foi mostrada pela TV para todo o mundo. No país mais laico do mundo, a França, os operadores, gerentes e diretores abriam o pregão de mãos dadas, com um padre atirando água benta para todos os lados, todos orando para que Deus salvasse o mercado.
Como se sabe, o gênio George W. Bush já havia tentado uma aliança com Deus para “salvar a América” declarando num discurso: "Quanto mais tempo passamos com Deus, mais nós vemos que Ele não é um rei distante, mas um amoroso pai".
Barack Obama, que não é tolo, também buscou inspiração divina para ganhar as eleições e continuar a obra que Democratas e Republicanos construíram pelo mundo e em sua própria casa. Obra cimentada com sangue, alicerçada no extermínio, estruturada pela pilhagem e coberta com bombas e napalm, cercada com destruição generalizada, para fazer a ultra-fortuna de alguns poucos milhares de capitalistas. Barack deixou claro ao longo de sua campanha como pretende salvar o capitalismo: "Eu quero que vocês orem para que eu possa ser um instrumento de Deus".
Assim, o mundo chega à mais importante crise econômica vivida desde 1929 com a classe dominante se entregando nos braços de Deus para salvar a economia capitalista!
Eles não têm saída
As palavras mais associadas à Barack Obama são "mudança" e "esperança". Se para milhões significa melhorar a vida, para os capitalistas é outra coisa. A burguesia em todo o mundo espera que com Barack venha uma "ressurreição" da economia e da classe dominante da nação mais poderosa do planeta, que perdeu o rumo e agora até mesmo a confiança em si mesma.
Os principais dirigentes da burguesia estão completamente aturdidos e não sabem o que fazer com a economia. Após a revolução russa de 1917 e da crise de 1929, eles descobriram John Maynnard Keynes para erguer um muro de contenção contra a revolução proletária. Foram as décadas de criação de déficits fiscais e de “regulação” do mercado pelo estado. Breton Woods foi seu auge com o dólar assumindo o posto de equivalente geral em lugar do ouro. O Titanic keynesiano foi a pique com Nixon tendo que dar um golpe mundial decretando, em 1975, a inconvertibilidade do dólar em ouro e deixando todo mundo com um monte de papel verde na mão.
Depois de décadas de cantos em louvor ao “deus mercado” e promessas de uma vida próspera para todos desde que se deixassem os capitalistas em paz, descobriram que o rei estava nu e estiveram rezando para um bezerro de ouro. Então chegou Moisés Obama com as novas Tábuas da Lei.
Jared Bernstein, conselheiro econômico de Barack Obama, afirma que uma administração Obama vai “cooperar com a Europa para regular o sistema financeiro mundial”, mesmo que “no comércio internacional queira rever acordos comerciais para ampliar a proteção” ao capital norte-americano. Segundo ele “para dentro e para fora Keynes é a referência. Não é o momento para políticas de austeridade”.
Mas, como a economia real não depende de Deus, mas dos capitalistas realmente existentes, Barack Obama já se cercou de homens como Paul Volcker, ex-presidente do FED, indicado primeiro por Carter e depois por Ronald Reagan. E também de Larry Summers, ex-secretário do Tesouro de Clinton. Ou seja, os mesmos que iniciaram o desastre que agora se concretiza nas mãos dos seus gêmeos-inimigos.
Alan Greenspan, ex-presidente do FED e conhecido como “o assoprador de bolhas”, em Wall Street, sabia muito bem, assim como Ben Bernanke, atual presidente do FED, e muitos outros capitalistas, de que a crise viria e seria brutal. Por isso assopraram tanto as bolhas para empurrar a crise para frente. Eles confiam em Deus e Ele, com certeza, deveria estar comprometido em resolver o problema. Afinal é pra aliviar as dores das classes dominantes que ele existe.
Infelizmente para os capitalistas, Deus não existe e não pode resolver as crises provocadas pelas próprias leis internas do modo de produção capitalista. Mas, eles não podem agir de outra forma porque não podem reconhecer a origem real da crise que se gera e se desenvolve a partir da “morada oculta da produção” que é de onde se arranca toda a riqueza produzida pela humanidade. Assim se debatem trocando os remédios, mas sendo incapazes de curar a enfermidade.
E atrás da onda de choque da crise financeira vem correndo como um rinoceronte a crise industrial, a crise de superprodução, que não pode ser impedida sem mecanismos catastróficos como as injeções artificiais como as bolhas de crédito e outras bolhas. Uma crise alimenta a outra porque elas têm a mesma origem: as leis internas próprias da apropriação privada dos frutos da produção social hoje disseminada pelo planeta Terra.
Vade retro, Satanás!
O pânico entre as classes dominantes é tamanho que alguns de seus intelectuais, abandonando toda veleidade “pseudo-científica” de seus trabalhos, tentam impedir seus governantes de adotar medidas pragmáticas de estatização ou mesmo de “regulação” do mercado financeiro agitando o espantalho de que estas seriam medidas advogadas pelos marxistas. O pânico é total entre eles. Uns atribuem aos marxistas o que pensam e fazem Gordon Brown, Bush, Merkel e Barack Obama com suas confusas e inúteis disposições de “regular o mercado financeiro”. Isto nunca foi marxismo, que pretende não regular o mercado financeiro e a especulação, mas estatizá-lo e terminar com a especulação.
É obvio que Lula, os governantes acima e o economista James Tobin, da Universidade de Yale, Prêmio Nobel de Economia em 1981, criador da ridícula proposta chamada de “Taxa Tobin” (uma taxa de 0,1% sobre a circulação de capitais financeiros para controlá-los e diminuir a pobreza no mundo!) jamais foram gente de esquerda e muito menos marxistas. Que eles consigam algum apoio da socialdemocracia e de certos grupos centristas não espanta, aliás, só confirma que estes só sobrevivem para dar oxigênio aos capitalistas como sua ala “esquerda”. Mas, para a burguesia é importante embaralhar as coisas para tentar erguer um cordão sanitário em volta das idéias e dos métodos do marxismo desacreditando-os. O que, no entanto é inútil, porque a realidade é mais forte que seus desejos e mesmo que todos os meios de que eles dispõem para inventar, camuflar, mentir e caluniar o marxismo e os marxistas.
Outros destes intelectuais burgueses estupidamente agitam outra vez os crimes de Stalin (cometidos contra os marxistas e a classe operária) para tentar justificar o capitalismo e seu desastre social, econômico e humano. Tentam não ver que a pressão do capital e suas classes dominantes é que conduzem aos Stálin (para restaurar o capitalismo) e Hitler (para impedir o socialismo).
É por isso que repentinamente o fantasma de Karl Marx volta a assombrar o mundo e freqüenta as discussões de todos os economistas e comentaristas. Só que para eles isso não vai resolver nada. Sem dúvida alguma se os capitalistas lessem e estudassem “O Capital” de Karl Marx, saberiam gerir muito melhor seus próprios negócios, mas mesmo assim não poderiam impedir as crises e a ampliação das nuvens de guerra e de morte que eles mesmos sopram sobre a humanidade e a civilização.
A burguesia imperialista está incapaz de enfrentar a classe operária norte-americana
Mas, com um olho na missa e outro no padre, a burguesia imperialista, especialmente seu setor mais lúcido, forte e dominante, o setor financeiro, buscou através da candidatura de Obama estender uma ponte com as classes populares para “unificar” o país na defesa do regime capitalista. O que esperam de Obama é que ele seja capaz de fazer a classe trabalhadora pagar a conta da crise através de “negociações” ao estilo do “New Deal” de Roosevelt.
Por isso Obama declarou simpatia por uma greve de metalúrgicos (com objetivo de soldar o apoio do aparato da AFL-CIO que havia apoiado Hilary). Assim como declarou que pretende retirar as tropas do Iraque (prometendo enviá-las para o Afeganistão, explicou depois). Frente ao tamanho da crise que se desenvolve, a burguesia imperialista norte-americana sabe que não pode enfrentar a situação em choque frontal com o movimento operário como decidiu Bush.
Obama precisa desesperadamente de “União Nacional” para enfrentar a crise e salvar o capital e reafirmar a continuidade da política imperialista norte-americana. Por isso na noite da vitória discursou: “A América mandou uma mensagem para o mundo de que não somos uma coleção de Estados azuis (democratas) ou vermelhos (republicanos). Nós somos, e sempre seremos os Estados Unidos da América”.
Esta “União Nacional” precisa fundamentalmente do acordo do movimento operário, das classes trabalhadoras e de suas organizações. E também vai enfrentar a resistência dos setores mais violentos da burguesia norte americana incapaz de compreender que não pode neste momento resolver a bala a discussão iniciada.
O azar deles é que os resultados da crise só podem gerar maior sofrimento e maior luta de classes nos Estados Unidos e em todo o mundo. Entramos num período novo na situação internacional em que se somam a crise e a incapacidade da burguesia de viver como antes assim como a vontade dos trabalhadores de não mais continuar a viver como viviam. A América Latina é prova de que isso já começou há algum tempo.
O Estado burguês engole a bola de fogo
As soluções adotadas durante o pânico só jogam lenha na fogueira. Com todos os mecanismos “de mercado”, incentivados pelos governos, eles criaram uma imensa bolha de crédito privado e uma imensa crise. Agora, com a injeção de trilhões de dólares, de estatizações (de dívidas) estes irresponsáveis conhecidos como “governantes do mundo livre” trazem para dentro do aparelho de estado o conjunto da crise. Ou seja, preparam a implosão do sistema de crédito público em proporções inimagináveis.
Quanto tempo eles têm pela frente não se sabe, mas para onde vai este navio desgovernado não há dúvidas. Ainda mais que hoje giram no “mercado” cerca de 600 trilhões de dólares e os governos, fazendo tudo o que podem, não puseram mais do que uma dezena de trilhão de dólares para “salvar o planeta capitalista” do afundamento generalizado.
Tudo o que podem fazer, e é o que fará Obama, é continuar a acelerar a montanha russa do capital. O mundo está assistindo a uma destruição massiva de capitais e ainda verá a ruína de setores inteiros da economia, desemprego, agudização da guerra comercial e da política de guerra em todo o mundo. Assim como a ampliação do caráter de estado policial que tomam cada vez mais todos os estados burgueses.
Junto com esta destruição massiva de riquezas e forças produtivas veremos a tentativa de ampliação dos ataques contra o “custo do trabalho”, a ampliação das contra-reformas da previdência, trabalhista, fiscal, etc.
É neste quadro que se verão as modificações políticas e as ações do novo governo dos Estados Unidos. Que a forma da política imperialista vai mudar não há dúvida, já que Obama ganha as eleições como resultado do desastre político, econômico, financeiro e social da era que se iniciou com Ronald Reagan e Thatcher.
O fantasma da revolução ronda o mundo
Bush, Gordon, Sarkozy, Angela Merkel, todos esqueceram abruptamente seus gritos contra a interferência do estado na economia e em semanas estatizaram mais do que Chávez em 10 anos. A diferença é política, pois Chávez estatiza no interesse das massas populares e com isso impulsiona a revolução. Bush, Gordon, Sarkozy, Angela Merkel, estatizam para salvar os capitalistas e para evitar a revolução que pode surgir da crise.
Há 150 anos Engels escrevia para Marx: "O crash americano é soberbo e está longe de ter chegado ao fim. Ainda vamos assistir ao colapso de uma boa parte das empresas; até agora só se arruinou uma ou outra. A repercussão na Inglaterra parece ter começado com o Borough Bank de Liverpool. Tant mieux [ótimo, em francês no original alemão]. Isso significa que, nos próximos três ou quatro anos, o comércio voltará a passar um mau bocado. Nous avons maintenant de la chance [Agora nós temos a possibilidade, em francês no original]”. St. Hélier, Jersey, 29 de Outubro de 1857.
“Agora nós temos a possibilidade”. Engels reafirma assim o que Marx já havia escrito: “A revolução proletária só será possível na esteira de uma soberba crise econômica. Uma é tão certa quanto a outra.” Esta compreensão é parte integrante da teoria revolucionária marxista.
É com esta situação que se enfrentará Obama
O vento revolucionário que varre a América Latina se junta hoje com a agudização das lutas de classes na Europa e nos Estados Unidos.
A grande questão a resolver para encerrar esta etapa da história da humanidade, o capitalismo, que já veio ao mundo suando sangue por todos os poros, é a construção de verdadeiros partidos operários marxistas, revolucionários, capazes de tomar nas mãos estas possibilidades existentes hoje e ajudar a classe operária a resolver o nó que ata e ameaça a humanidade, liquidando o regime capitalista, planificando a economia e libertando os homens e mulheres de toda opressão e exploração.
Para isso é preciso continuar o combate de Marx, Engels, Lenin e Trotsky pela revolução proletária e de construção da Internacional Marxista. O fato de que não existam hoje partidos operários capazes de se colocar esta questão como tarefa imediata é que pode permitir aos capitalistas destruir forças produtivas e se recuperar em determinado espaço de tempo. Mas, seja, para esta crise ou para a próxima, é preciso resolver esta questão.
Construir o instrumento de resolução da crise que corrói a civilização é a tarefa central dos marxistas intervindo nas organizações de massa da classe operária. Usar todas as possibilidades trazidas por esta crise para explicar a falência do capital e a necessidade do socialismo, organizar e mobilizar os trabalhadores para defender suas conquistas e levantar-se a altura de suas necessidades históricas e construir a organização revolucionária, eis o trabalho que devem realizar os marxistas.
Como Lênin já explicou o capitalismo não cairá sozinho, ele deve ser derrubado. Do contrário, este regime baseado na exploração do homem pelo homem seguirá sua marcha de sangue, dor e sofrimento, deixando estendidos pelo caminho crianças, velhos, homens e mulheres, após tê-los mantidos subjugados como força bruta de produção e ter deles extraído toda a força vital, até afundar toda a civilização na barbárie. Mais do que nunca o mundo se encontra com a encruzilhada: Socialismo ou barbárie.
Source: Esquerda Marxista