Pelo fim do ataque de Maduro ao Partido Comunista da Venezuela

A direção do Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV), partido do governo na Venezuela, caminha para a fase decisiva de seu plano de minar o Partido Comunista da Venezuela (PCV). Em 21 de maio, um grupo de agentes a soldo realizou um fraudulento “Congresso Extraordinário de Filiais do PCV” em Caracas, usurpando a sigla e os símbolos do Partido Comunista e preparando o terreno para futuros ataques ao partido por parte do Estado.

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Este ato vergonhoso, claramente realizado sob as ordens da direção do PSUV, foi repudiado por amplas camadas da esquerda nacional e internacional, inclusive por membros e figuras do próprio partido governista. A ampla reação à ameaça de intervenção no PCV desde o início desta polêmica fez com que o PSUV agisse com cautela.

Perfecto Abreu – presidente legítimo do PCV – declarou em entrevista à Rádio Unión, que nenhum membro ativo do PCV participou desse circo midiático. O PCV forneceu uma lista de participantes, demonstrando as credenciais reais dos mercenários políticos pagos que lideraram o falso congresso. Entre eles, membros conhecidos do PSUV e um indivíduo que havia sido expulso do PCV há mais de um ano.

Está muito claro que o objetivo dessa manobra é sequestrar a bandeira legal do PCV ou, na falta disso, paralisar o partido, impedindo a ele e à Alternativa Popular Revolucionária (APR, coalizão de esquerda da qual o PCV é um dos membros) de participar em futuras eleições.

A direção do PSUV teme que surja uma oposição de esquerda com apoio de massas. Por isso vem recorrendo a medidas autoritárias destinadas a cercear a atividade política da APR em geral e do PCV em particular.

Antecedentes

Os ataques da direção do PSUV contra o PCV começaram em 2020, após o rompimento deste último com as políticas antioperárias do governo. A virada decisiva ocorreu quando o PCV, tendo rompido com o Grande Polo Patriótico (GPP, a coalizão de partidos liderada pelo PSUV), se juntou a outros grupos para formar a APR em agosto do mesmo ano. Na APR, o PCV – junto com várias organizações revolucionárias, incluindo Lucha de Clases, a seção venezuelana da Corrente Marxista Internacional – formou uma nova aliança eleitoral à esquerda do PSUV.

O Estado respondeu com um golpe judicial afastando a direção do Pátria Para Todos (PPT), partido que esteve envolvido na formação da APR. Em seu lugar, o controle do partido foi entregue a uma nova direção, vinda da facção minoritária de direita contrária à participação na APR. Dessa forma, a APR só conseguiu apresentar candidaturas às eleições parlamentares de 2020 e às eleições regionais de 2021 na chapa do PCV.

Desde então, altos dirigentes do PSUV pedem a censura da APR em época de eleições, e houve uma série de campanhas de difamação e ameaças contra o PCV. Esses ataques foram realizados junto a tentativas fracassadas de subornar dirigentes ou membros do PCV. Foram métodos semelhantes aos utilizados na chamada “Operação Escorpião”, durante a qual dirigentes e empresários do PSUV compraram deputados de direita no final de 2019, para que não reconhecessem Juan Guaidó.

Em toda essa vergonhosa história, destaca-se o discurso presidencial de novembro de 2020, durante o qual Nicolás Maduro escondeu com a mão o símbolo do PCV enquanto mostrava a cédula de votação para as eleições parlamentares daquele ano.

A investida anticomunista se intensificou a partir de novembro de 2021. Na época, o vice-presidente do PSUV, Diosdado Cabello, denunciou pela televisão ter recebido cartas de supostos integrantes do PCV. Segundo essas cartas, esses militantes imaginários do PCV estariam questionando a direção do partido e continuariam a apoiar o governo nacional, e supostamente, portanto, rejeitavam a oposição e a dissociação do partido à política do governo – uma política adotada pelo partido em 2020 e ratificada em seu 16º Congresso em 2022.

Em 4 de fevereiro, em uma marcha em Caracas convocada pelo PSUV para comemorar o 31º aniversário do levante militar liderado por Hugo Chávez em 1992, agentes provocadores do estado de Monagas, disfarçados com camisetas e símbolos do PCV, anunciaram que iniciariam uma “processo de resgate do PCV”, devolvendo-o ao GPP – a aliança eleitoral liderada pelo PSUV.

Com esse objetivo, no dia 11 de fevereiro, foi realizada uma reunião de supostos membros do PCV de vários estados do centro e do leste do país em um conhecido hotel da cidade de Maturín. Esses supostos militantes denunciaram sua suposta exclusão pela direção do partido, que, segundo eles, se colocou a serviço do imperialismo norte-americano.

A direção nacional e o Comitê Regional de Monagas do PCV imediatamente negaram que os participantes da reunião pertencessem a seu partido e apresentaram evidências de que esses indivíduos haviam trabalhado anteriormente com o PSUV. Eles também demonstraram que funcionários do Conselho Nacional Eleitoral participaram dessa reunião fraudulenta. O fato de o destacamento de mercenários políticos ter iniciado suas ações no estado de Monagas indica que o ataque contra o PCV está sendo coordenado por Diosdado Cabello – vice-presidente do PSUV cujo estado natal é Monagas.

Semanas depois, vazou nas redes sociais uma gravação de Jesús Faría Tortosa, ex-partidário do PCV e atualmente no PSUV, conhecido por sua escandalosa defesa da política econômica do governo. O vazamento indicava que ele coordenava assembléias de mercenários políticos em vários estados, além de tentar recrutar membros do PCV e filhos de ex-líderes do PCV para ataques ao partido.

Eventualmente, o falso congresso foi realizado em 21 de maio. Pouco se sabe sobre as decisões e resoluções que foram tomadas. Isso porque se tratava de um mero circo midiático destinado a preparar a opinião pública para a intervenção do Estado no partido.

As opções para completar este plano incluem o uso do Supremo Tribunal de Justiça, uma decisão que poderia deixar de reconhecer a direção legítima do PCV e conceder a titularidade legal do partido a uma junta de mercenários do PSUV. Alternativamente, a organização poderia ser paralisada por meio de recurso ao Conselho Nacional Eleitoral.

Intervenção Estatal

A intervenção do governo nos partidos políticos, especialmente nos de esquerda, é típica da tática reacionária da direção do PSUV e se baseia nos métodos do bonapartismo. Essa direção, valendo-se do Estado, inicialmente se apropriou dos símbolos e bandeiras legais dos partidos de direita como Acción Democrática (AD), Primero Justicia (PJ), Voluntad Popular (VP), entre outros, em uma tentativa fracassada de construir uma oposição sob medida, algo que nunca decolou.

Isso não difere da atitude antidemocrática da direita do país, que, apesar de ter fracassado em suas tentativas de tomada do poder, sempre demonstrou tendências golpistas e o desejo de perseguir e proscrever a esquerda. O golpe de abril de 2002 mostrou em poucas horas quão pouco os direitos políticos e democráticos significam para a burguesia nacional e o imperialismo. O constante choro dessas camadas sobre a falta de democracia na Venezuela não passa de pura hipocrisia.

Depois de terem sido usadas para atacar a direita, as táticas intervencionistas passaram a ser dirigidas contra partidos de esquerda, como PPT, Tupamaros, Unidad Popular Venezolana (UPV) e outros. Isso foi executado com o claro objetivo de entregar o controle dos partidos a indivíduos e tendências simpatizantes de Maduro, em flagrante desrespeito aos seus processos democráticos internos e à vontade de seus membros.

No caso dos partidos de esquerda nos quais interveio, a direção do PSUV deseja ter o controle absoluto do GPP e dos partidos que o constituem. Essa intervenção antidemocrática nos partidos políticos é o meio pelo qual o governo resolveu a seu favor a luta contínua das tendências partidárias, para que pudesse emitir ordens diretas sem questionamentos. Hoje, o GPP não é mais do que uma coligação em torno do PSUV reunindo um conjunto de partidos sequestrados, sem vida própria. O medo da crítica mais morna ou mesmo do surgimento de uma oposição de esquerda é a base de toda a sua existência.

Políticas antioperárias e a eliminação da esquerda

Com o desenvolvimento da crise capitalista mundial e seu forte impacto na Venezuela – agravada por sua economia rentista e pelas contradições de uma revolução descarrilada por sua direção – o governo se propôs a uma solução burguesa e antioperária. Enterrando quase todas as conquistas da primeira fase da Revolução Bolivariana, Maduro embarcou em um pacote de austeridade que pulveriza salários e direitos trabalhistas. O governo privatizou inúmeras empresas estatais e promete a criação de Zonas Econômicas Especiais, enquanto prende trabalhadores e sindicalistas que protestam ou tentam organizar a resistência da classe trabalhadora.

Com base na corrupção mais obscena, a direção do PSUV favoreceu o surgimento de uma casta de novos-ricos, tão parasitária quanto a burguesia tradicional, ancorada em uma economia baseada em bodegones (lojas caras de produtos importados) e na mais profunda desigualdade social.

O futuro da Venezuela está sendo negociado pelas costas e em detrimento da classe trabalhadora. A direção do PSUV – representando os novos-ricos e apoiada pela Rússia e China – está em diálogo com a burguesia: com os sindicatos patronais, as organizações empresariais etc., apoiadas pelos Estados Unidos. A destruição da esquerda faz parte desse acordo que se encontra em construção entre eles.

Com o planejado assalto ao PCV, a burocracia do PSUV está dizendo à burguesia tradicional e às diversas potências imperialistas que não há com o que se preocupar, que a política de Chávez está morta e que as alusões demagógicas do Estado ao socialismo não passam de retórica vazia.

Uma das razões desta ofensiva contra a esquerda é a contradição que existe hoje na Venezuela. Enquanto os dirigentes políticos exploram cinicamente o legado de Chávez e da revolução, simultaneamente executam ataques ferozes à classe trabalhadora. Essa contradição torna o governo vulnerável a uma alternativa de esquerda.

Solidariedade com o PCV

Como marxistas, nos opomos a todas as tentativas de minar as liberdades democráticas e os direitos de organização política que favoreçam o Estado burguês. Leon Trotsky, em seu artigo Liberdade de Imprensa e a Classe Trabalhadora (1928), apontou: “A teoria, assim como a experiência histórica, testemunham que qualquer restrição à democracia na sociedade burguesa, é eventualmente dirigida contra o proletariado, assim como os impostos eventualmente cairão sobre os ombros do proletariado”. A Venezuela hoje é a maior prova dessas palavras.

Como explicamos ao longo de nossa análise recente, a Revolução Bolivariana foi interrompida no meio do caminho e depois descarrilada por sua direção pequeno-burguesa. Depois de queimar os dedos tentando implementar a quimera de uma economia mista, ela abraçou, desde 2018, uma política liberal e monetarista na esfera econômica e métodos bonapartistas nas esferas social e política. A terrível crise que atravessa a Venezuela não é fruto do socialismo, que nunca foi instaurado. Pelo contrário, é o resultado do capitalismo rentista que a direção do PSUV tem mantido com teimosia ignorante.

Apesar das diferenças das políticas e tradições entre a Corrente Marxista Internacional (CMI) e o PCV, é dever dos revolucionários apoiar o PCV, que está sob o cerco de um governo determinado a violar direitos políticos e democráticos em sua corrida para impor políticas econômicas antioperárias a todo custo. É um governo que, embora tente cair nas boas graças da oligarquia tradicional e do imperialismo, não se envergonha de criminalizar as lutas dos trabalhadores e perseguir a esquerda. A direção do PSUV deixou cair a máscara que a vinculava à esquerda.

Os camaradas da CMI na Venezuela oferecem o nosso apoio e solidariedade aos membros do PCV nestes dias difíceis. O compromisso político dos quadros do partido deve prevalecer e manter-se firme. A maneira mais eficaz de enfrentar as políticas antidemocráticas do governo é continuar apelando para a solidariedade revolucionária da classe trabalhadora. O PCV deve apelar para as organizações da classe trabalhadora na Venezuela e no mundo, pois enfrenta as políticas do governo nas ruas, nos campos, nas fábricas e nos locais de trabalho.

É dever dos revolucionários – e mesmo dos democratas consistentes – de todo o mundo se manifestar contra o assalto ao PCV. Ao nos unirmos em solidariedade, devemos exercer a pressão necessária para dar ao governo uma pausa para que questione o passo que está prestes a dar. A solidariedade com o PCV conseguiu, até agora, retardar o andamento desse plano do governo.

Agora é a hora de dobrar a aposta! Luta, resistência e solidariedade são o único caminho a seguir!

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