Uma tentativa de golpe de Estado imperialista está em curso na Venezuela. No dia 10 de janeiro, o presidente Maduro foi empossado para um novo mandato. Ele venceu a eleição de 20 de maio. Na ocasião, uma parte da oposição decidiu participar do processo eleitoral e outra decidiu boicotar as eleições. Em 11 de janeiro, Juan Guaidó, presidente da oposicionista Assembleia Nacional (em desacato à lei desde 2015), recusou-se a reconhecer a posse de Maduro e declarou-se disposto a assumir a presidência “com o apoio das forças armadas, do povo e da comunidade internacional”.
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Além de ser uma decisão completamente ilegal, tomada por um órgão em desacato e que não segue qualquer preceito constitucional, trata-se de um chamado às Forças Armadas para que derrubem o presidente eleito. Tal atitude tem um nome: golpe de Estado.
O primeiro a responder foi o secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), Almagro, um dos instigadores do golpe, que foi além das palavras de Guaidó e o declarou presidente (algo que o próprio Guaidó não havia dito). Ele afirmou:
“Nós saudamos a posse de @jguaido como presidente interino da #Venezuela conforme o Artigo 233 da Constituição Política. Tem nosso apoio, da comunidade internacional e do povo da #Venezuela.”
Claramente Guaidó foi um pouco mais precavido, afirmando que estava “disposto a assumir” a presidência. Mas Almagro, em sua obsessão doentia em se livrar de Maduro o mais rápido possível, nomeou Guaidó presidente pelo Twitter.
O imperialismo americano apoia o golpe
Em 10 de janeiro, o Secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, havia feito um chamado semelhante às Forças Armadas para que derrubassem Maduro, logo, para que realizassem um golpe de Estado, que segundo ele era uma questão urgente:
“Os EUA condenam a usurpação ilegal do poder realizado por #Maduro e chama aqueles que apoiam o regime venezuelano, inclusive as forças de segurança que juraram defender a Constituição, a parar de permitir a repressão e a corrupção. A hora para o retorno da democracia na #Venezuela é AGORA.”
Em sua mensagem golpista, Pompeo falou especificamente sobre a capacidade da Assembleia Nacional (isto é, a oposição agindo em desacato à lei) de “recuperar fundos perdidos”, os quais se encontram nos EUA. Em outras palavras, ele oferece financiamento ao golpe.
A ideia é clara: criar um “governo paralelo” que o imperialismo (os EUA, a OEA e a União Europeia) possam reconhecer e, a partir disso, forçar a “mudança de regime”.
Em 11 de janeiro, durante um telefone a Guaidó, Pompeo reafirmou seu apoio à Assembleia Nacional como única autoridade legítima, embora tenha evitado falar de Guaidó como presidente (por enquanto).
Em 12 de janeiro, durante uma nova declaração oficial, o Departamento de Estado dos EUA aumentou seu apoio ao golpe em curso. A declaração inclui uma clara e precisa instrução para “mudança de regime”, afirmando que “é hora de iniciar ordenadamente a transição para um novo governo”.
Portanto, o plano está de pé. A visita de Pompeo ao Brasil para a posse de Bolsonaro, sua viagem à Colômbia e a última declaração do “cartel de Lima” (com a honrosa exceção do México) foram passos necessários na preparação do atual cenário.
A tentativa de golpe só poder ser bem-sucedido se for capaz de ganhar uma parcela significativa das Forças Armadas ou através de uma intervenção militar (um governo de fato não se cria simplesmente através de uma declaração). Em último caso, todo governo é baseado no monopólio da força para fazer valerem suas decisões.
Para aumentar as chances de quebra das Forças Armadas Nacionais Bolivarianas (FANB), a Assembleia Nacional discute uma “lei de transição”, na qual será oferecida imunidade a todos que virarem a casaca e se juntarem à mudança de regime. De acordo com a Reuters, “o esboço de 17 páginas intitulado Lei que rege a transição para a democracia’… inclui artigos que “asseguram que desertores das Forças Armadas não serão perseguidos por um futuro governo se abandonarem Maduro”.
O serviço secreto dos EUA tem trabalhado duro para comprar ou chantagear oficiais de alta patente a fim de que liderem um movimento contra o presidente eleito. Nos últimos anos, houve uma série de conspirações golpistas sem sucesso. O alto comando militar tem interesses materiais pela manutenção da atual ordem constitucional.
O governo ofereceu contratos vultosos aos militares através da empresa Companhia Anônima Militar de Indústrias Mineiras, Petrolíferas e de Gás (Camimpeg) e também colocou diversos oficiais militares à rente de empresas estatais, dando a eles uma fonte substancial de renda legal e ilegal. Mas isso não significa que eles vão permanecer leais em toda e qualquer situação. Se virem que há uma possibilidade de que Maduro seja derrubado, sem dúvida haverá setores entre os militares de alta patente que, diante da oferta de imunidade e preservação de sua riqueza, estarão dispostos a participar em golpe de Estado ou em alguma outra forma de “transição negociada” (um golpe com outro nome).
O Washington Post, citando fontes dentro do serviço secreto dos EUA, afirmou que o chefe das Forças Armadas, Vladimir Padrino, pediu a Maduro que renunciasse ou ele próprio renunciaria. É bem provável que esta seja mais uma tentativa de Washington para espalhar desinformação e rumores, mas tal cenário não pode ser descartado a esta altura dos acontecimentos.
A “lei de transição”, escrita pela Assembleia Nacional (em desacato à lei) é explícita acerca dos objetivos centrais do golpe nos campos político e econômico:
“Controles centralizados, medidas de expropriação arbitrárias e outras medidas similares serão abolidas… Para isto, o modelo centralizado de controles econômicos será substituído por um modelo de liberdade e de mercado baseado no direito de cada venezuelano de trabalhar sob as garantias do direito de propriedade e livre iniciativa.”
Em outras palavras, as empresas nacionalizadas serão devolvidas a seus antigos donos (inclusive as telecomunicações, o setor elétrico, a siderúrgica SIDOR, a produção de cimento etc.), assim como as grandes propriedades expropriadas. Cabe ressaltar que fala-se muito sobre os direitos de propriedade e empreendimento, mas não se mencionam os direitos dos trabalhadores, que certamente podem ser abolidos. O documento prossegue:
“As empresas públicas serão sujeitas a um processo de reestruturação que garanta uma gestão transparente e eficiente, inclusive através de acordos público-privados”.
Em linguagem comum, isso significa demissão em massa de trabalhadores das empresas estatais e a entrada de capital privado nelas: uma política de pilhagem que já se provou desastrosa em todos os países em foi aplicada. Obviamente, há outros fatores nesta equação. Um deles é o fato de que uma ameaça real de intervenção imperialista tende a unificar as forças do chavismo, mesmo os setores mais críticos e desiludidos. O saudável sentimento anti-imperialista é bastante forte na Venezuela e vai além do núcleo duro que ainda vota no PSUV.
A isso se somam as fortes declarações feitas pela Rússia contra qualquer intervenção na Venezuela, as quais foram acompanhadas por manobras militares e pela presença no países de bombardeiros russos Tu-160, capazes de carregar armas nucleares. Do ponto de vista geoestratégico do conflito entre a Rússia e os EUA, a Venezuela é um ponto de apoio importante para Rússia, o qual ela não parece disposta a abandonar, pelo menos por enquanto. A Rússia também adquiriu interesses importantes na Venezuela sob a forma de petróleo e outros contratos, e não parece disposta a derrubar o governo de Maduro, ainda mais após os sucessos na Criméia e na Síria.
Combater o golpe! Defender a Revolução Bolivariana!
Dados os fatos, desnecessário dizer, a posição de qualquer democrata, e obviamente qualquer revolucionário, socialista e anti-imperialista é a de rejeitar essa escandalosa interferência imperialista e a descarada tentativa de golpe por parte da oposição reacionária.
A Corrente Marxista Internacional já declarou abertamente que não apoia as políticas do governo Maduro e não chamou voto para ele na eleição de 20 de maio. No entanto, aqui se trata de algo diferente, de um golpe de Estado, que se bem-sucedido levaria a burguesia reacionária e o imperialismo a tomarem as rédeas do poder. Podemos imaginar os efeitos disso para a classe trabalhadora e os pobres, não apenas na Venezuela.
Nós não deixamos de criticar o governo Maduro. Consideramos que sua política (de conciliação de classe) não apenas é incapaz de resolver a profunda crise econômica, mas também de várias maneiras representa um grave recuo em relação às conquistas da Revolução Bolivariana, seja por ação ou por omissão. Além do mais, tal política mina e enfraquece aluta real contra o imperialismo. Em primeiro lugar, porque desanima as massas trabalhadoras e populares que são o bastião e a força motriz da revolução; mas também porque se baseia em concessões vergonhosas ao capitalismo turco, chinês e russo, além das multinacionais norte-americanas e francesas (vide os mais recentes contratos assinados pela empresa EREPLA, com sede nos EUA, e pela multinacional francesa Maurel & Prom).
Mas de modo algum isso significa ter um posição ambígua ou neutra em face de um golpe de Estado. Ao contrário, nós clara e enfaticamente nos opusemos a ele. Ao mesmo tempo, nós avançamos o programa que julgamos necessário para combater o golpe de maneira eficiente: expropriação de todas as empresas multinacionais dos países envolvidos na conspiração e de todos os capitalistas que financiem e encorajem o golpe; controle operário e revolucionário em todos os níveis para combater a quinta-coluna reformista e burocrática; entrega dos latifúndios aos camponeses organizados e das fábricas ociosas ou semiparalisadas aos trabalhadores a fim de erguer um plano nacional de produção sob controle operário que comece a satisfazer as necessidades imediatas das massas; a renúncia total e imediata ao pagamento da dívida externa; um chamado à classe trabalhadora e aos povos do mundo para defender a Revolução Bolivariana contra a agressão imperialista.
NÃO PASSARÃO!